Adaptando a metodologia de ensino, o professor de história explica como usar do hiperfoco característico do autismo para tornar as aulas mais inclusivas
O potiguar Henrique Alexandre Medeiros de Lucena tem anos de experiência como professor de História do Ensino Médio no Colégio Nossa Senhora das Neves, em Natal. Sempre preocupado em garantir que todos os alunos estejam realmente absorvendo o conteúdo necessário, Henrique se viu em uma situação delicada ao perceber que um de seus alunos da 3ª série não estava conseguindo aproveitar a aula como os outros.
Sempre hiperfocado no celular durante as explicações, o estudante Arthur Siqueira é autista e tem dificuldade em se manter atento durante aulas longas, com conteúdo teórico e expositivo. “Percebia que ele ficava sempre jogando, o que não permitia que ele criasse conexão com o conteúdo ou com os colegas de sala”, relata o professor.
O hiperfoco é uma das características do autismo, e acontece quando pessoas no espectro apresentam um interesse intenso em um assunto muito específico. Os temas de interesse são os mais variados: arte, jardinagem, músicas ou animais.
No caso de Arthur, o hiperfoco é em games, e começou aos nove anos quando o garoto ganhou um videogame de presente. Rossana de Biase Campos, mãe de Arthur, conta que essa paixão de longa data já rendeu frutos na vida do filho. “Com 13 anos, ele já começou em cursos de criação de jogos, e, no ano passado, Arthur prestou o concurso para o Instituto Metrópole Digital na UFRN e passou para técnico em jogos virtuais”, conta.
Apesar de ser exemplar nos cursos de desenvolvimento de games, ainda faltava conseguir focar na sala de aula. Então, após conversar sobre o assunto com a professora auxiliar Jane Silva, que dá apoio ao aluno em sala de aula, Henrique decidiu fazer uma aula experimental que conectasse o conteúdo da disciplina com o universo dos games. A ideia era deixar que o estudante fizesse uma apresentação sobre a história de um dos seus jogos favoritos, enquanto o professor conectava a narrativa histórica do game com o conteúdo do Enem.
Essa troca entre professores padrões e professores auxiliares é uma das vantagens de ter profissionais como Jane em sala de aula. “Sem o professor auxiliar, a perda é significativa no desempenho do estudante com deficiência. Com um profissional dando um estímulo de motivação e incentivando a autonomia do aluno, é mais provável que ele tenha sucesso não só na aprendizagem, como também nas relações de relacionamentos socioemocionais”, diz Jane.
Ao criar um equilíbrio entre as demandas específicas do aluno e o conteúdo que precisava ser dado, o professor conta que alcançou um resultado que foi muito além da fixação da matéria. “Consegui dar todo conteúdo e notei que depois dessa experiência houve uma melhoria inclusive no relacionamento dele com a turma e comigo. Criou-se um ambiente mais social e, consequentemente, uma maior facilidade educacional”, conclui Henrique.